Congregação Judaica Shaarei Shalom – שערי שלום

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Uriel D’Acosta nasceu no Porto, em Portugal. Seu pai era cristão-velho, mas sua mãe era uma judia convertida à força. O casal tinha três filhos, entre eles Gabriel D’Acosta, como Uriel era conhecido por seu nome cristão. Sua família era muito culta e Uriel teve uma educação privilegiada, tendo estudado direito na Universidade do Porto e latim na Universidade de Coimbra. Uriel D’Acosta chegou serviu como tesoureiro da catedral do Porto, mas era um jovem muito curioso e, apesar da educação católica, conhecia sua própria origem judaica, razão pela qual dedicava seu tempo livre aos estudos do Velho Testamento. Assim, Uriel passou a conhecer o Tanah de forma muito profunda.
Assim que seu pai faleceu, Uriel decidiu fugir com toda a sua família para Amsterdã, onde existia uma vibrante comunidade judaica. Na verdade, grande parte da família de sua mãe já vivia nos Países Baixos. A família D’Acosta chegou em Amsterdam no mês de abril de 1615. Gabriel D’Acosta e seus irmãos foram circuncidados e, a partir de então, Gabriel passou a ser conhecido como Uriel D’Acosta, deixando definitivamente as aparências católicas para trás.
No interior da vida comunitária judaica em Amsterdam, Uriel entrou em conflito com os rabinos, pois era um grande conhecedor do Tanah e ficou desapontado com a versão rabínica do judaísmo. Em Portugal, Uriel nunca teve contato com o judaísmo rabínico e, por esse motivo, acreditava que os costumes seguidos pelos judeus eram exatamente aqueles descritos no texto bíblico. Sem saber que o judaísmo rabínico havia construído formas diversas de compreender o Velho Testamento, Uriel fez seu retorno às origens judaicas com base nos seus próprios estudos sobre o texto bíblico.
D’Acosta passou a questionar as leis e as práticas rabínicas, contestando sua posição como verdadeiras leis originais da Torah. Mais além: Uriel acusou as autoridades rabínicas de reformistas, considerando que elas haviam se afastado muito do texto bíblico real. As palavras de D’Acosta foram um vendaval no mundo rabínico, ao acusar o judaísmo rabínico de ser excessivamente ritualizado e de valorizar as leis rabínicas como mais importante que as leis originais da Torah.
D’Acosta foi ainda mais longe, quando, em 1616, escreveu seu primeiro escrito sobre o tema: “Propostas Contra a Tradição”, composição que o levou a ser oficialmente excomungado de sua comunidade, em 1618. D’Acosta descobriu que o judaísmo rabínico era completamente diferente do judaísmo em que ele havia definido sua identidade judaica.
Podemos dizer que Uriel D’Acosta foi o primeiro judeu com ideias emancipatórias, antes mesmo de Espinoza, que era ainda um jovem adolescente nesse período.
Uriel D’Acosta terá um fim trágico por não ter abandonado suas ideias. Excomungado de sua comunidade e também privado de seus livros, que serão queimados em praça pública, D’Acosta fez uma tentativa de se integrar na comunidade judaica de Hamburgo, mas também foi rechaçado pelos judeus alemães. Após ser acusado de blasfêmia e de ateísmo, Uriel foi perseguido de forma tão cruel que acabou em um estado de total miséria e abandono. Sua mãe foi a única pessoa da família e do resto do mundo que ainda o visitava.
A dor e a humilhação serão grandes, de modo que, em 1640, D’Acosta solicita ser readmitido na comunidade judaica de Amsterdam em troca de uma dura penitência, uma humilhação pública total: Uriel recebeu trinta e nove chicotadas e foi pisoteado por toda a comunidade, de acordo com o ritual de readmissão rabínica que vigia na época. Após essa última situação totalmente degradante, D’Acosta escreveu uma breve autobiografia, “Exemplar Humanae Vitae”, “Exemplo de Uma Vida Humana” em latim, para, logo depois, cometer suicídio, em 1640.
Uriel D’Acosta cometeu um único grande pecado em toda a sua vida: o de não abrir mão de sua crença judaica. Depois de morto, Uriel se tornou um grande exemplo da luta da razão contra a superstição. Para muitos, Uriel D’Acosta surgiu como um antecessor de Espinoza.
E eu fico aqui imaginando esse período, em que o grande filósofo judeu Baruch Espinoza ainda era um jovem adolescente e uma testemunha ocular desse acontecimento tão trágico. Tenho certeza de que Espinoza conhecia as ideias de Uriel D’Acosta, quem certamente foi, sem saber, o grande mestre intelectual de Espinoza, que mais tarde escreverá a obra “Deus sive Natura”, “Deus ou Natureza” em latim, livro que também o levou a ser expulso e excomungado de sua comunidade judaica.
Com tudo isso, uma coisa é certa: essas duas grandes personalidades judaicas de origem portuguesa, Baruch Espinoza e Uriel D’Acosta, vão deixar um grande legado para o futuro do judaísmo moderno e humanista.
fontes :
Uriel da Costa e a Nação Portuguesa
Adma Muhana
https://virtual-illusion.blogspot.com/…/uriel-da-costa
https://www.livrariaferreira.pt/…/alguns-documentos…/



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