Congregação Judaica Shaarei Shalom – שערי שלום

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  1. As tradições de um enterro judaico

 maringá  Por Gesli Franco,especial para a Gazeta do Povo [03/10/2015]

Cuidado e respeito com aquele ou aquela que acaba de morrer são atitudes tomadas em todas as religiões. Mas os rituais pós-morte em algumas delas elevam o zelo com o falecido e preservam tradições distintas e até curiosas. É o caso do Judaísmo e suas leis mosaicas, que conservam, há milênios, os mesmos procedimentos no momento da despedida. Anunciada a morte de um judeu, a primeira providência da família é comunicar o Chevra Kadisha – grupo de voluntários que orienta e realiza todos os procedimentos funerários. “É considerado um grupo santo, pois a tarefa realizada se relaciona diretamente com a santidade”, explica o rabino Pablo Berman, da Comunidade Israelita do Paraná, .

A preparação do corpo é conhecida como Tahara – o momento de purificação. Um banho cuidadoso com água pura é feito cuidadosamente pelo grupo, enquanto preces são recitadas pedindo perdão – em nome do falecido –pelos possíveis pecados cometidos em vida. Tudo é realizado no próprio cemitério israelita, em um local reservado.

A tradição segue o que diz o Livro de Eclesiastes: “assim como veio, assim irá”. Para os judeus, a passagem designa tratamento semelhante ao dado aos recém-nascidos, que são imediatamente lavados quando saem do útero para que fiquem fisicamente limpo e espiritualmente puro. Para os judeus, o mesmo deve ser feito no momento da partida. Para o rabino, essa é uma das maiores ações de amor ao próximo no Judaísmo. “Tudo é feito de maneira voluntária. Acreditamos que a alma ainda está próxima à pessoa nesse momento”.

Ao fim do banho ritual, o falecido é vestido com o Tachrichim, um conjunto de roupas brancas, com camisa, calça e luvas, que representam a neutralidade com que a alma irá se encontrar com o Criador, segundo a tradição judaica. Os olhos recebem uma pedra cada um.

Também é repousada uma terceira pedra na boca. A religião ensina que isso impede o questionamento da própria morte ou ainda que o falecido se encontre com D´us antes do Juízo Final. Depois disso, o caixão é fechado ou o corpo enrolado em um pano branco e ocorre um breve velório. Orações fúnebres são recitadas em hebraico. Em seguida, sete parentes enlutados rasgam um pedaço da própria roupa em alusão ao coração dilacerado pela perda.

Sepultamento – Pela lei judaica, o corpo deve ser sepultado o mais breve possível, de preferência no mesmo dia da morte. A explicação é de a alma não consegue descansar até ser sepultada. A única exceção à regra é em caso de mortes violentas, em que decisões judiciais podem atrasar a cerimônia. corpo deve ser sepultado em um caixão simples, sem ornamentos — apenas uma Estrela de Davi na parte superior, que leva também as iniciais do morto. Segundo a Associação Religiosa Israelita Chevra Kadisha, do Rio de Janeiro, a tradição frisa “a igualdade de todos os seres humanos em sua morada final. Na morte, rico e pobre se encontram, pois ambos foram criados por D´us” (Provérbios 22:2)”.

O sepultamento deve ser feito em um cemitério israelita, denominado por eles como “casa do mundo” ou “casa da eternidade”, em um jazigo único, aceitando-se somente um parente a mais em cada túmulo. O caixão é colocado na cova em contato com a terra, enquanto um membro da família é responsável por jogar as primeiras pás de terra que começam a cobrir a madeira.

Uma lápide é colocada com escritos hebraicos informando nome, data de nascimento e morte, além de citações bíblicas. Em geral, depois de um ano, pedras são colocadas sobre o sepulcro, baseando-se na tradição bíblica, quando Jacó colocou pedras para sua esposa Raquel, em sinal de homenagem. Esse gesto, explica a Associação Israelita carioca, assegura que os mortos não serão esquecidos e a sepultura não será profanada. “Uma das funções básicas da pedra tumular é manter viva a memória do falecido. E, de acordo com o Talmud [livro sagrado], a memória dos mortos torna-se menos intensa após 12 meses.” [1]

  1. Como proceder em casos de falecimento – Em caso de falecimento a Chevra Kadisha mantém atendimento telefônico permanente. Ligue para (21) 2502-9933 / (21) 8232-8089 a qualquer hora do dia. Perguntas Frequentes
  2. Por que se costuma fechar os olhos do falecido imediatamente após a morte? De acordo com a tradição mística judaica, a pessoa quando morre encontra-se com o Criador. E seria indecoroso contemplar a Presença Divina ao mesmo tempo em que se observa as coisas mundanas. Fechando os olhos do falecido para o mundo físico, permitimos que ele os abra para a paz do mundo espiritual. Geralmente é o filho quem pratica este ato, em lembrança das palavras confortantes de D´us ao patriarca Jacob: “Teu filho José colocará as mãos sobre teus olhos” (Gênesis 46:4).
  3. Por que se cobre o corpo logo após o falecimento? A tradição judaica considera que deixar o corpo à vista é uma violação do princípio de “kevod ha’met”, respeito pelos mortos. Mais ainda, se deixássemos o corpo exposto, estaríamos limitando nossa perspectiva à realidade física da morte. Cobrindo-o, tentamos conservar na memória a imagem da pessoa em vida, e alargamos nossa visão para abranger uma dimensão espiritual .

3 .Por que se colocam velas acesas ao lado do corpo?  “0 espírito do homem é a vela do Senhor” (Provérbios 20:27). A luz das boas ações praticadas pelo falecido ao longo da vida o acompanhará ao repouso eterno. De acordo com o pensamento místico judaico, a chama simboliza a alma do ente que partiu, pois ela se dirige sempre para o alto. Mantendo uma vela acesa durante a primeira semana de luto, e também no dia do aniversário do falecimento, estamos ajudando a ascensão da alma aos céus.

  1. Quanto tempo após a morte deve se realizar o sepultamento? A lei judaica ordena que o corpo seja sepultado o mais breve possível, de preferência no mesmo dia. Uma exceção é feita no Shabat e no Yom Kipur, durante os quais não se pode realizar o enterro. Adiar o sepultamento é visto como um desrespeito para com o falecido e só deverá ocorrer na necessidade de aguardar a chegada dos filhos. Segundo as fontes místicas judaicas, a alma só descansa depois que o corpo é enterrado .
  2. Por que é costume fazer um rasgo na roupa dos enlutados? Este ritual, keriá, é um sinal tradicional de luto desde os tempos bíblicos. A Torá relata que Jacob, ao receber a falsa notícia de que seu filho José tinha sido devorado por uma fera, reagiu “rasgando as vestes” (Gênesis 37:34). Também David rasgou suas vestes ao saber da morte do Rei Saul e seu filho Jonathan. Esse ritual tem uma finalidade psicológica: uma forma de descarregar a dor e a angústia diante da perda de um ente querido. Ao rasgar a roupa, o enlutado profere a benção “Baruch Dayan Emet”, “Bendito seja o verdadeiro Juiz”, demonstrando assim que apesar da tragédia, sua crença em Deus e na justiça divina continua inabalável.
  3. A lavagem do cadáver antes do enterro não seria uma profanação do corpo? Muito pelo contrário. um tributo que prestamos ao morto. A origem desta tradição milenar se encontra no Livro de Eclesiastes: “Assim como veio, assim irá.” Da mesma forma como um recém-nascido é imediatamente lavado e ingressa no mundo fisicamente limpo e espiritualmente puro, assim também aquele que parte é simbolicamente purificado através do ritual da tahará (“purificação”).
  4. Por que o corpo é sepultado envolto apenas em uma simples mortalha branca? No antigo Templo, o Sumo Sacerdote usava uma simples vestimenta de linho branco no dia mais sagrado do ano, Yom Kipur. Lá ele confessava a D´us, e pedia o perdão divino pelos seus pecados e os pecados do seu povo. Analogamente, quando a pessoa morre, ela vai ao encontro do Criador envolta numa simples roupa branca, símbolo de humildade e pureza.
  5. Por que as pessoas que acompanham o caixão fazem apenas algumas paradas antes de chegar ao túmulo? Simbolicamente, as paradas demonstram nossa relutância em nos separarmos do ente querido que morreu.

Mais ainda, enterrando ricos e pobres em vestes iguais, simples e sem quaisquer ornamentos, ressaltamos um dos grandes valores judaicos e universais: a igualdade social.

  1. Por que os parentes mais próximos jogam os primeiros punhados de terra sobre o caixão? Nas palavras da Bíblia: “Porque és pó, e ao pó tornarás” (Gênesis 3:19). Participando do ato do sepultamento, demonstramos que aceitamos a vontade de D´us. Simbolicamente, devolvemos a Ele o que Ele nos deu.
  2. Por que não há caixões ornamentados e flores nos enterros judaicos? Nós judeus frisamos a igualdade de todos os seres humanos em sua morada final. Na morte, “rico e pobre se encontram, pois ambos foram criados por Deus” (Provérbios 22:2). Somente as pessoas abastadas poderiam ser enterradas com pompa. Por esta razão, fazemos questão de realizar o enterro sem ostentação, sem enfeites, sem flores, ressaltando o respeito ao falecido através da simplicidade. Mais ainda, nossos rabinos tinham receio da tendência humana de cultuar os mortos. É interessante notar que o local do sepultamento de Moisés é desconhecido, para evitar que cometamos o pecado da idolatria. Nós, como judeus, não cultuamos os mortos. Pelo contrário: diante da morte, reafirmamos a vida. E traduzimos a memória em ação.
  3. Quando se vai ao cemitério para um enterro, pode-se aproveitar e visitar túmulos de parentes e outras pessoas? Claro que sim. A lei judaica nos proíbe visitar o mesmo túmulo duas vezes num único dia. Esta regra tem sido mal interpretada por algumas pessoas, que entendem ser proibido visitar outro túmulo depois de assistir a um enterro. Completamente sem fundamento. Por outro lado, a lei judaica exige que, no final do enterro, os presentes fiquem em fila para consolar os enlutados. Talvez por este motivo, alguns acham desaconselhável visitar outro túmulo após o enterro. Em suma, é permitido visitar quantos túmulos se queira, desde que antes seja cumprida a obrigação humana de dar apoio e solidariedade aos recém-enlutados.
  4. Por que os judeus lavam as mãos ao saírem do cemitério? Certamente não por motivos de higiene. A morte não é suja; a morte é uma parte natural, lógica e orgânica da vida. Lavamos as mãos porque a água é o símbolo da vida, reafirmando assim nossa crença de que a vida é mais forte do que a morte. Após lavar as mãos, deixamos que elas se sequem naturalmente, sem usar uma toalha. Simbolicamente, demonstramos assim nosso desejo de jamais obliterar nossos laços com o falecido e, pelo contrário, conservá-lo em nossa memória para todo o sempre .
  5. Por que é costume incluir ovos na primeira refeição dos enlutados após o enterro? A forma arredondada do ovo simboliza a natureza cíclica e contínua da vida, e reflete nossa crença na imortalidade da alma. Embora não retenha mais seu formato original, o ovo foi num estágio anterior a fonte de uma nova vida.

Assim também, apesar de não podermos mais desfrutar da presença física do ente querido que partiu, estamos conscientes de que as sementes que ele plantou aqui na Terra ainda gerarão belos frutos, e que seu espírito viverá eternamente. Outra explicação: assim como o ovo não pára numa mesma posição e vira continuamente, esperamos que a nossa sorte também possa virar, e que a tristeza de hoje possa se transformar na alegria de um novo amanhã .

  1. Em que consiste a tradição de ficar sete dias em casa após uma morte na família (Shivá)? A palavra “Shivá” significa “sete”, e se refere ao período de sete dias de luto contados a partir do dia do enterro. A tradição tem origem na Torá, quando José “chorou sete dias” pelo seu pai, Jacob (Gênesis 50:10). Durante uma semana, os enlutados ficam em casa, abstendo-se de quaisquer atividades profissionais ou de lazer. Parentes e amigos fazem visitas de condolências a casa dos enlutados, e três vezes por dia (de manhã, à tarde e à noite) realizam-se serviços religiosos. A instituição da Shivá tem como finalidade dar a família folgas psicológicas e espirituais para continuar depois da perda de um ente querido. O enlutado não está só; muito pelo contrário, ele faz parte da “comunidade dos enlutados de Sion”. É esta consciência de grupo que lhe dá conforto, já que recebe o apoio e o consolo dos familiares e amigos durante estes dias e que lhe permite emergir fortalecido, preparado para enfrentar as vicissitudes da vida, e pronto para reassumir suas responsabilidades perante o seu povo .
  2. Por que se cobrem os espelhos de uma família enlutada? Trata-se de um costume relativamente recente (datando da Idade Média), que pode ser explicado de várias maneiras. Primeiramente, durante a Shivá (a primeira semana de luto), realizam-se diariamente serviços religiosos na casa dos enlutados. A lei judaica proíbe rezar diante de um espelho. Outra razão é que a função básica do espelho relaciona-se diretamente com a vaidade pessoal, e esta contraria o espírito do luto, especialmente durante os primeiros dias, quando o enlutado deve se abster de fazer a barba, cortar o cabelo, enfeitar-se, etc. Finalmente, o espelho reflete a imagem da pessoa somente se ela estiver fisicamente presente diante dele. Ao cobrirmos os espelhos na casa dos enlutados, demonstramos simbolicamente que mesmo sem a presença física daquele ente querido que partiu, sua imagem continua real e viva. Longe dos olhos não é longe do coração .
  3. Por que os enlutados sentam-se no chão durante a Shivá? O costume provém do relato bíblico sobre o Rei David. Ao receber a notícia da morte de seu filho, David “rasgou suas vestes e prostrou-se por terra” (II Samuel 13:31). Sentando-se no chão ou em banquetas baixas, os enlutados expressam seu pesar e seu desejo de ficar perto da terra na qual o ente querido está sepultado.
  4. Por que os enlutados não usam sapatos de couro durante a Shivá? O desconforto físico é um meio de acentuar o estado de luto. Neste contexto, os enlutados abstêm-se de usar sapatos de couro, roupas novas, cosméticos, enfim tudo que traz conforto e prazer.
  5. Por que não se faz barba quando se está de luto? Quando perdemos alguém que nos é muito querido, nós nos “retiramos” da sociedade. Abatido pelo trágico golpe, o enlutado se abandona simbolicamente, descuidando a aparência pessoal, deixando crescer a barba e o cabelo durante trinta dias, assim como o antigo nazireu. O espírito do isolamento é o de um afastamento temporário do convívio social.
  6. Por que não se observa a Shivá no Shabat e nos feriados principais? De acordo com a lei judaica, nenhum indivíduo pode chorar uma perda pessoal nos dias nacionais de festividade. A santidade e a alegria do Shabat e dos feriados sobrepõem-se à tristeza do luto. Embora o Shabat seja contado como um dos sete dias, interrompe-se temporariamente a observância da Shivá, e os enlutados costumam sair de casa nesse dia para assistir aos serviços religiosos na sinagoga. Quando termina o Shabat, reinicia-se a Shivá. Se um dos principais feriados judaicos (ou seja, os feriado bíblicos) cai durante a Shivá, o restante da Shivá é anulada. O mesmo acontece quando ocorre um feriado entre o término da Shivá e o trigésimo dia de luto: anula-se o restante do Shloshim (veja pergunta seguinte).
  7. O que é Shloshim? A palavra “Shloshim” significa “trinta” e se refere ao período de luto entre o término da Shivá e o trigésimo dia. Existe na Bíblia uma alusão ao prazo de um mês como período de luto: “Ela permanecerá em tua casa, chorando seu pai e sua mãe durante um mês” (Deuteronômio 21:3). Embora muitas das restrições referentes à Shivá sejam mantidas durante o Shloshim, o enlutado começa nesta fase a reintegrar-se na sociedade e reassume, em parte, sua vida normal .
  8. O que é Kadish? 0 Kadish é um hino de louvor a Deus. Por ser tradicionalmente recitado nos enterros e nos serviços comemorativos dos finados, ele é popularmente considerado como uma oração pelos mortos. Entretanto, o Kadish não faz nenhuma referência à morte ou ao luto. É puramente uma exaltação a Deus e uma súplica por um mundo de paz. Embora os cabalistas do século XVI atribuíssem um caráter místico ao Kadish, alegando que toda vez que ele era recitado, a alma do falecido se elevava a um nível espiritual mais alto o valor intrínseco do Kadish se relaciona à pessoa que o recita. É uma expressão pública de fé em Deus por parte do enlutado, uma aceitação da Sua vontade mesmo em face da dor e da tristeza, uma submissão aos desígnios divinos diante da incapacidade de racionalizar uma tragédia pessoal. O Kadish tem sido um dos fatores predominantes da continuidade do povo judeu – um elemento essencial daquele cordão umbilical que vem ligando as gerações judaicas uma à outra através dos tempos .
  9. Como o Judaísmo entende a vida após a morte? A idéia de vida após a morte é um postulado da teologia judaica, porém não uma afirmação. E como muitos outros conceitos, está sujeito a diversas interpretações. Para uns, a noção de “vida após a morte” é uma declaração da crença na vinda do Messias, que ressuscitará fisicamente os mortos. Para outros sábios, é o paraíso das almas, chamado de Gan, Éden espiritual . [2]

Fontes: [1] Gazeta do Povo: http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/as-tradicoes-de-um-enterro-judaico-auwyfcjo3y0i26ezz567gsxp8

[2] Chevra Kadisha: http://www.chevrakadisha.com.br/regras-do-luto/

Coordenador: Saul Stuart Gefter



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